SEML destaca desafios da avaliação de sequelas e da crescente conflitualidade médico-legal

08/11/2025

No 44.º Congresso Nacional de Ortopedia e Traumatologia, a Secção de Estudos Médico-Legais (SEML) da SPOT propõe-se abordar um tema de grande relevância e sensibilidade: a avaliação das alterações da integridade psicofísica nas lesões ortopédicas, com particular foco nos casos práticos e na patologia do ombro. A sessão foi moderada por Cristina Varino Sousa, próxima coordenadora da SEML. Segundo o coordenador da Secção, Francisco Lucas, “as sequelas ortopédicas continuam a ser matéria de particular importância, mas também de assinalável complexidade”.

Essa complexidade, explica, resulta de múltiplos fatores: “a dificuldade no tratamento das lesões, a subjetividade inerente à avaliação pericial, a impossibilidade de submeter os sinistrados a exames invasivos e as inevitáveis reações psicológicas que surgem ao reviver a situação”. Para Francisco Lucas, compreender e dominar estas nuances é essencial para uma prática médica mais rigorosa e justa, tanto do ponto de vista clínico como jurídico.

A Secção chama também a atenção para a crescente litigância associada à prática médica. “A litigância subsequente ao tratamento, relacionada com alegações de negligência ou erro médico, trouxe maior conflitualidade”, alerta o coordenador. “Os tempos que se avizinham não são fáceis. Com o evoluir das redes sociais e o maior acesso dos utentes à informação, seguramente vamos assistir a um aumento dos conflitos.” Francisco Lucas defende que o ortopedista deve estar consciente deste novo contexto e adotar uma postura prudente, empática e respeitosa na relação com o doente. “Se não houver, por parte do profissional, algum cuidado e decoro na maneira como aborda o paciente, seguramente será maior a fonte de conflitualidade.”

O coordenador lamenta ainda a reduzida participação dos jovens médicos ortopedistas nas atividades da SEML, o que considera sintomático de um desconhecimento generalizado da importância da vertente médico-legal na vida profissional. “Creio que muitos ainda não se aperceberam da verdadeira dimensão da problemática médico-legal e do impacto que um processo de litigância pode ter na nossa vida profissional e pessoal”, afirma. Por essa razão, a Secção tem desenvolvido ao longo dos anos diversas iniciativas em colaboração com juristas de reconhecido mérito, procurando sensibilizar, formar e apoiar os ortopedistas nesta matéria. “A Secção pode assumir um papel relevante como elemento de consulta e apoio ao médico ou perito, sempre que o ortopedista o solicitar.”

Com a experiência acumulada ao longo dos anos, Francisco Lucas deixa uma reflexão profunda sobre o papel do médico no contexto atual: “Nenhum de nós se conhece verdadeiramente enquanto não sofrer. Os tribunais são a montra do desempenho médico. É bem verdade que o drama dos utentes e sinistrados deriva, muitas vezes, da consciência do médico ou perito malformado.” E acrescenta: “Todas as épocas têm o seu tempo. No tempo atual, à exigência da igualdade, reintegração social e familiar, junta-se agora a robótica, a inteligência artificial, o desconhecido.”

Consciente das mudanças e desafios que o futuro trará, o coordenador deixa uma mensagem dirigida especialmente aos jovens ortopedistas: “É nesta penumbra de conflitualidade de pensamentos e de interesses inerentes ao mundo contemporâneo que os jovens ortopedistas vão ter de se confrontar e sobreviver. Caros jovens, cuidem-se, sejam competitivos, mas com uma certa dose de humildade e humanidade e, sobretudo, sejam amigos uns dos outros.”

A intervenção da SEML neste Congresso pretende, assim, reforçar a importância do conhecimento médico-legal na prática ortopédica, promovendo uma reflexão ética, técnica e humana sobre o papel do ortopedista no contexto jurídico e social contemporâneo.