Fáscia plantar

Fasceíte plantar ou esporão no calcâneo?

Luís Barbosa Pinto, Médico Interno de Ortopedia e Traumatologia | Centro Hospitalar Tondela – Viseu

A fáscia plantar é uma estrutura fibrosa que se localiza na planta do pé, estendendo-se desde o calcâneo (osso do calcanhar) até aos dedos. É uma estrutura fundamental para a biomecânica do pé, na medida em que permite manter o arco interno do mesmo em situações de carga e durante a marcha. Em situações de “stress” repetidas, começam por ocorrer microrroturas na sua inserção a nível do calcâneo levando a uma inflamação que muitas vezes assume contornos de cronicidade. Por vezes, esta inflamação poderá levar à deposição de cálcio e à formação do comummente designado esporão do calcâneo. É importante referir que o foco do tratamento é a inflamação (ou seja, a fasceíte) e não o esporão.

É uma entidade muito comum, estimando-se que 1 em cada 10 pessoas irá sofrer de fasceíte plantar ao longo da sua vida. De entre os fatores de risco demonstrados, destacam-se: trauma repetido por sobrecarga mecânica (atividade física regular e intensa), uso de calçado inadequado, obesidade, meia-idade, um pé cavo ou plano e a presença de um tendão de Aquiles encurtado.

O sintoma mais característico é a dor, a nível da face interna do calcanhar, tipicamente ao dar o primeiro passo da manhã (ou após situações de repouso) e que melhora após dar mais alguns passos, podendo piorar novamente ao final do dia.

O diagnóstico é baseado na clínica (sintomas) do doente, sendo que quando pedidos exames complementares de diagnóstico, na ecografia poderá ser visível um espessamento da fáscia plantar e na radiografia um esporão do calcâneo. A ressonância magnética pode também ser usada em situações em que há dúvidas quanto ao diagnóstico.

O tratamento inicial é conservador (não cirúrgico) e deve ser realizado pelo menos por um período de 1 ano, reservando-se a cirurgia para situações refratárias.

O tratamento conservador consiste na combinação de exercícios de alongamento e reforço excêntrico dos músculos da região posterior da perna, tendão de Aquiles e fáscia plantar, anti-inflamatórios, aplicação de gelo local e adaptação da atividade física. A isto pode-se ainda associar a infiltração com corticóides. Atualmente tem-se vindo a alargar o panorama do tratamento conservador desta entidade, com o crescente interesse na terapia com ondas de choque extra-corporais e no uso de infiltrações com plasma rico em plaquetas (PRP’s). De referir, que existe ainda pouca evidência científica relativamente ao uso de PRP’s no tratamento de fasceíte plantar. Se após um período de mais de 1 ano de tratamento conservador a sintomatologia persistir, a cirurgia deverá ser ponderada.

O ato cirúrgico consiste classicamente na libertação parcial e seletiva da parte medial da inserção da fáscia plantar no calcâneo, quer seja por via aberta, percutânea ou endoscópica. Nos últimos anos, pelos seus bons resultados descritos até ao momento tem-se vindo a dar uma importância crescente ao procedimento de libertação da inserção proximal do gémeo interno, enquanto tratamento cirúrgico da fáscia plantar.

É importante salientar que, classicamente a fasceíte plantar apresenta uma evolução benigna e que cerca de 90-95% dos doentes melhoram num período de 1 ano, independentemente do tratamento escolhido (conservador ou cirúrgico).

 

Por: Luís Barbosa Pinto, Médico Interno de Ortopedia e Traumatologia | Centro Hospitalar Tondela – Viseu

Joanete

O que é um joanete?

Manuel Resende Sousa, ortopedista, Coordenador da Secção do Pé da Sociedade Portuguesa de Ortopedia e Traumatologia.

O Joanete é um termo comum usado para a deformidade denominada de hallux valgus. A partir do momento que temos uma deformidade instalada, a mesma só será passível de correcção por via cirúrgica. Dito isto, a presença de hallux valgus não necessita de ser sempre corrigida cirurgicamente. Em muitos casos a deformidade é assintomática e a gravidade da mesma não é sinónimo de maior dor. Existem doentes com deformidades graves sem qualquer dor e doentes com deformidades ligeiras com muita dor.

Não sendo possível corrigir a deformidade sem cirurgia, podemos prevenir algumas queixas e procurar prevenir o agravamento da mesma através de algumas medidas. Destas destacamos o uso de calçado confortável de caixa larga contrapondo ao uso regular de salto alto e caixa triangular afilada que tantas vezes circulam nas passerelles dos desfiles de moda. Alguns doentes procuram usar correctores de uso nocturno contudo a eficácia dos mesmos não está comprovada.

Por: Manuel Resende Sousa, ortopedista, Coordenador da Secção do Pé da Sociedade Portuguesa de Ortopedia e Traumatologia.

Hallux Valgus ou Joanete para os amigos

Diogo Neves Gameiro
Médico Interno de Ortopedia (3º ano de Internato) | Hospital Distrital Figueira da Foz

Hallux valgus ou vulgo joanete é uma deformidade tridimensional frequente, que se caracteriza pela má posição da 1ª articulação metatarsofalângica do pé. Esta deformidade consiste no desvio lateral/em valgo do 1º dedo do pé (hallux), isto é, desvio do hallux em direção ao dedo mínimo, e desvio no sentido oposto (medial) do 1º osso metatarso.

Esta alteração leva ao desenvolvimento de uma proeminência óssea (bunion) que tem muitas vezes uma bursa a envolvê-la e pode inflamar (bursite) com a utilização repetida de calçado apertado. Esta deformidade está muitas vezes associada a outras alterações, nomeadamente, dedos em garra e/ou em martelo, encurtamento do tendão de Aquiles e pé plano.

A causa desta doença parece ser multifatorial, com fatores extrínsecos e intrínsecos envolvidos na patogénese da doença. Os fatores extrínsecos incluem o calçado, o trauma repetido (como por exemplo, o ballet), a sobrecarga mecânica repetida, obesidade e a realização de caminhadas longas. Os fatores intrínsecos incluem fatores genéticos, sexo (sendo 10 vezes mais frequente no sexo feminino), idade e aspetos anatómicos (metatarsus primus varus, pé plano, forma da cabeça do metatarso, obliquidade da articulação cuneometatársica, hipermobilidade do 1º raio, laxidez ligamentar e músculos do hallux).

As queixas mais frequentes são a dor, vermelhidão (quando existe bursite), calosidades, a dificuldade em encontrar calçado adequado e a própria deformidade.

O diagnóstico é feito através da observação do pé, mas os exames de imagem, nomeadamente as radiografias, são importantes para a avaliação da deformidade e para o planeamento cirúrgico.

A principal indicação para o tratamento desta patologia é a dor.

O tratamento conservador desta patologia (não cirúrgico) não corrige a deformidade, mas pode aliviar os sintomas. Este passa pela alteração do calçado, a utilização de ortóteses noturnas, espaçadores interdigitais entre o 1º e o 2º dedos do pé, a proteção do bunion, a utilização de anti-inflamatórios não-esteróides e a aplicação de gelo.  Este tratamento é particularmente reservado a doentes com patologia neuromuscular ou com contraindicação cirúrgica.

O tratamento cirúrgico é o gold-standard nesta patologia. De grosso modo, os procedimentos envolvem a buniectomia (remoção do bunion), libertação das partes moles envolvidas na deformidade (libertação da cápsula articular da articulação metatarsofalângica, tendão adutor do hallux e ligamento sesamoide) e procedimentos sobre o 1º metatarso e/ou falange proximal (cortes no osso para realinhamento do mesmo – osteotomia) e/ou procedimentos sobre as articulações envolvidas nesta deformidade (fusão das articulações metatarsofalângica e/ou tarsometatársica – artrodese).

Existem mais de 100 procedimentos cirúrgicos descritos, cada um com as suas vantagens e desvantagens, sendo que as indicações variam consoante o grau de deformidade, a presença ou não de artrose, hipermobilidade da articulação cuneometatársica, bem como da preferência do próprio cirurgião.

Os procedimentos cirúrgicos podem ser realizados de forma aberta ou de forma minimamente invasiva (percutânea), que tem ganho bastante interesse nas últimas décadas.

A prevenção da deformidade passa pela utilização de calçado adequado e sobretudo pela evicção da utilização de sapatos de salto alto

Por: Diogo Neves Gameiro, Médico Interno de Ortopedia (3º ano de Internato) | Hospital Distrital Figueira da Foz